sexta-feira, janeiro 30

ORWEU. O diálogo que se segue é um exerto de uma conversa entre dois jornalistas, na redacção do jornal Farol dos Piolhos, no dia 30 de Janeiro de 2006. Num tom de exemplar civilidade, os dois profissionais discutiam a legitimidade do programa americano para a «Democratização da orla costeira africana», onde se sabia estarem refugiados os principais cabecilhas da Al Aqsa, junto de plataformas petrolíferas. Era então o maior risco que o mundo civilizado enfrentava, já que os perigosos guerrilheiros eram suspeitos de estar armados com as temíveis ogivas nucleares que podiam destruir o mundo inteiro em sete segundos e meio, fabricadas pelos melhores artífices de charutos do regime de Castro:

- É engraçado falares desses cientistas que foram fuzilados por fogo amigo, lembra-me aquele caso Hutton.
- Hutton?
- Sim, aquele em que demitiram os gajos todos da BBC depois deles terem dito que o governo tinha mentido sobre as armas químicas.
- Ahhh, esse! Mas o governo mentiu mesmo não foi?
- Mentiu, mas... (longa pausa)... agora que dizes isso, não me lembro porque é que os gajos foram acusados.
- Morreu um gajo qualquer não foi?
- Foi, o tal cientista, mas acho que esse não tinha nada a ver com a história. Á! Já sei! Eles disseram que o governo tinha «apimentado» um dossier sobre armas químicas, quando na verdade só lhe fez quinze alterações para o «tornar mais forte».
- Mmmmm....

quinta-feira, janeiro 29

HUTTON 1. Enquanto ando às voltas com o trigo factual, refugio-me aqui para o joio opinativo. Greg Dyke, o director-geral da BBC que se demitiu na sequência do relatório Hutton, é o chefe que todos os jornalistas gostariam de ter. Ou deveriam gostar de ter. Voltarei ao assunto, prometo.
LOBOTOMIA Apercebi-me mesmo agora que, além das deformações na fala, a prática diária da lingua francesa afectou-me o raciocínio. Até quando leio inglês tenho um irritante sotaque gaulês que me atrasa a compreensão das palavras. Ridículo.

quarta-feira, janeiro 28

GALPALIZAÇÃO Ontem, no palácio do Eliseu, o presidente Jacques Chirac foi anfitrião de uma cerimónia de apoio ao Pacto Global, iniciativa do secretário-geral da ONU, Kofi Annan, no sentido de comprometer as empresas a respeitar diversos princípios éticos, sociais e ambientais na sua actividade. Dezenas de responsáveis estiveram simbolicamente presentes, entre os quais portugueses, e afirmaram o seu empenho na causa. Provavelmente, no mesmo momento, o porta-voz da Galp fazia declarações ao DN, pouco surpreendido por o ministério do Ambiente, em nome das reservas nacionais de gasolina, ter autorizado a reactivação do parque de combustíveis de Sacavém. Sim, no mesmo local para onde estava anunciado, nos velhos tempos da construção da Expo'98, "o maior parque urbano da Europa". Eis que a esperança surge no fundo o barril. Dispondo-se a zarpar para Sines, a Galp propõe a alteração ao PDM municipal para, quem sabe, se construir uma interessante urbanização, de preferência de habitação social, construída com materiais que não degradem o ambiente e respeitando a reserva ecológica do Estuário do Tejo, que por acaso é mesmo em frente. Assim, e sem infringir os exemplares preceitos louvados a 1.800 km de Lisboa, a Galp poderia vender o terreno por uns milhões de euros que ajudassem a financiar a construção de um novo parque, de acordo com outra importante norma, a de "não prejudicar os interesses da empresa". Parece aquela história do bater de asas da borboleta e do terramoto no outro lado do mundo. Ou da outra, da corrente de ar nos EUA e da constipação no Japão. Neste caso, acho que a borboleta apanhou um resfriado.

terça-feira, janeiro 27

AUSÊNCIA. Uns dias longe do ecrã e um grupo de descrentes pergunta-me logo se já desisti do blogue. Muito pelo contrário! O que aconteceu é que nas últimas semanas reparei que alguns dos nossos melhores blogs têm passado por longos períodos de silêncio. Vai disto, como não gosto de ficar atrás das elites, decidi fazer o mesmo. Portanto, se passo por este sacrifício de quando em vez, é precisamente para vos mostrar, caros leitores, que levo isto muito a sério. Muito obrigado pela preocupação.

segunda-feira, janeiro 26

VIVA A BURKA

Vauro no Il Manifesto
WEBCAM Foi a loucura. Ano e meio depois de ter voltado a Lisboa, um camarada da resistência parisiense comprou uma câmara e lançou a inveja. Fomos nessa, claro. A primeira videoconferência resultou na perfeição e repetimos, a solo e em grupo. Mesmo depois de passada a novidade, continuávamos a gostar de falar uns minutos por dia, à noite, só para matar saudades, para trocar umas receitas ou para dar as últimas do futebol ou da política. A coisa correu sempre tão bem que decidimos marcar um jantar. Um casal de cada lado, de câmara ligada, mantivémos o costume antigo e enquanto uns trataram do prato principal os outros ocuparam-se das bebidas. Quando ligámos o programa, a carne ainda estava no formo, por isso fomos beberricando umas cervejas e fazendo as graçolas de sempre. Quando fomos para a mesa, já estávamos tocaditos. A troca de galhardetes continuou. A fechar o jantar veio o café e a mousse de chocolate da praxe, que fomos digerir para o sofá, onde os temas de conversa são mais sérios e íntimos. A música estava boa, a cerveja e a aguardente continuaram a animar até que decidimos perder o último Metro e aproveitar estes momentos, que a distância tornou mais raros. A cavaqueira continuou até tarde e foi com o amanhecer que decidimos dormir mesmo ali no chão, em camas improvisadas, como nos velhos tempos.
GRIPE AVIÁRIA
Estou muito melhor
do defluxo, obrigado.
O corrimento nasal
foi
estancado.
FEHÉR Felizmente, só posso imaginar a histeria mediática em Portugal à volta da morte do jogador do SLB.
NEVE Caiu durante vários minutos, mas não ficou nada. Maldita chuva que fez derreter tudo. Nem os mosquitos vão poder fazer batalhas de neve. Sinto-me enganado.

sábado, janeiro 24

E MAIS FUTEBOL. Há uns meses, numa breve conversa com um inglês sobre o Euro2004, perguntei-lhe como tinham corrido as coisas por aqui, em 1996. «Bem. Tirando as pessoas que viviam perto dos estádios ou que estavam directamente envolvidas na organização, quem não quis saber do assunto não soube mesmo». Em Portugal, como todos suspeitamos, isto vai ser difícil. Durante um mês, à parte do Euro, vai haver... Euro. Mas o preocupante nem é isto. Para tudo correr bem seria necessário abandonar o vício nacional do desenrascanço, que agora, por razões que me ultrapassam, está na moda elogiar. Já se viu que no que diz respeito à segurança há cursos, seminários, formação e simulações quanto baste para nos convencer que alguém se preocupa com o assunto. Se será suficiente só saberemos na altura.
Mas para que a segurança não esteja para o Euro como o défice para a economia - uma obsessão - é preciso fazer outras perguntas: as câmaras já reforçaram o pessoal para lidar com as toneladas de lixo que vai aparecer em todo o lado?; os comerciantes já providenciaram as encomendas para aproveitar o afluxo de tanta gente?; os trasportes públicos já equacionaram respostas para o acréscimo de movimento?; as mil e uma instituições de turismo já prepararam programas específicos para dar que fazer aos turistas nas semanas de intervalo entre os jogos?; os jornais e as televisões já têm equipas em número suficiente para acompanhar todas as equipas? Pois... na dúvida eu assisto de longe.
GLOBETROTTER. Cumprindo essa árdua tarefa que é promover o Euro 2004, o ministro da Presidência foi a Madrid e agora vai a Londres, Haia, Berlim, Praga, Moscovo, Riga, Estocolmo, Zagreb, Sófia, Atenas e Milão. O Euro é porreiro ou não é?
TRADIÇÕES. O famoso double-decker londrino está em vias de extinção. Cinquenta anos depois de terem sido inventados (creio que pela Leyland), a câmara de Londres está a proceder à substituição impiedosa deste ícone genial dos ingleses. Hoje afastou-os de mais duas linhas centrais. É claro que o fim não é assumido frontalmente - até porque poderia provocar uma revolução nacional -, mas já ficou claro que todos os novos autocarros terão a fronha arrogante dos primos escandinavos. E agora o quê? Querem matar o carteiro Pat?

quinta-feira, janeiro 22

WHEN HARRY MET SALLY. A estreia da versão West End é já em Fevereiro, no Thatre Royal. Imagino que não vai ser fácil fechar os olhos e imaginar a Meg Ryan antes da plástica, o Billy Crystal antes dos filmes de terceira e Nova Iorque antes dos anos 90. Mas dou-me por satisfeito se repetirem esta passagem do evangelho das relações.

Sally: We are just going to be friends, OK?
Harry: Great, friends. It's the best thing...You realize, of course, that we can never be friends.
Sally: Why not?
Harry: What I'm saying is - and this is not a come-on in any way, shape, or form - is that men and women can't be friends, because the sex part always gets in the way.
Sally: That's not true. I have a number of men friends and there is no sex involved.
Harry: No, you don't.
Sally: Yes, I do.
Harry: No, you don't.
Sally: Yes, I do.
Harry: You only think you do.
Sally: You're saying I'm having sex with these men without my knowledge?
Harry: No, what I'm saying is they all want to have sex with you.
Sally: They do not.
Harry: Do too.
Sally: They do not.
Harry: Do too.
Sally: How do you know?
Harry: Because no man can be friends with a woman that he finds attractive. He always wants to have sex with her.
Sally: So you're saying that a man can be friends with a woman he finds unattractive.
Harry: No, you pretty much want to nail them, too.
Sally: What if they don't want to have sex with you?
Harry: Doesn't matter, because the sex thing is already out there, so the friendship is ultimately doomed, and that is the end of the story.
ABORTO. Já vou tarde, mas ainda vou. A sondagem do Público sobre o aborto, de dia 19, mostra-nos que a maior parte dos portugueses, entre 63 e 78 por cento (consoante sejam contra ou a favor a descriminalização, respectivamente) apoiam a realização de um novo referendo. Mais importante que isso, diz que 69 por cento dos portugueses responderiam agora que «sim» e apenas 25 por cento que «não». Quando falei do tema pela primeira vez, há cerca de um mês, criticaram-me por partir de um pressuposto errado: o de que a maioria dos portugueses era a favor da despenalização. Pois bem, agora não sou eu que o digo.

PS: É bom que ninguém tenha vindo destacar o facto de o responsável pelo estudo ser o centro de sondagens da Católica. Será, imagino, porque ninguém põe em causa o profissionalismo do dito. Mas agora que penso no assunto... não era bem isso que andavam para aí a dizer há um mês pois não?

terça-feira, janeiro 20

COJONES. Ontem, na BBC, Tony Blair dispôs-se a ser entrevistado sobre o tema mais quente da política interna inglesa: o aumento das propinas. Não foi uma entrevista qualquer. Blair sentou-se num canto do ringue, sozinho com os seus argumentos. Do outro lado, nada mais nada menos que o mais temido peso pesado do jornalismo político britânico, Jeremy Paxman, e uma plateia de 30 pessoas composta por alunos, pais e professores, que em comum apenas tinham o ódio visceral à proposta do governo. Durante cerca de uma hora, Paxman (que é o que Margarida Marante e Manuela Moura Guedes sempre quiseram ser: um jornalista agressivo mas com uma pinta do caraças) acirrou a plateia até ao limite. E Blair, com a habilidade do melhor domador de leões, voltou a dominar a raiva na ponta da vara. Mais do que os argumentos sobre o assunto - que não diferem muito dos nossos e dos que se discutem nos restantes países europeus, calculo - o que me impressionou em tudo isto foi a coragem do primeiro-ministro. Quando é que veremos um dos nossos ilustres chefes de governo fazer o mesmo? Nunca.
RUC Para os interessados e interessadas, a Rádio Universitária de Coimbra está online: http://www.ruc.pt:8000. Música alternativa sem pretensões.
EFEMÉRIDE Hoje faz quatro dias que este blogue não mexia. Provavelmente, devia ter esperado até aos cinco dias e escrevia um post de 200 linhas sobre o assunto, com depoimentos de leitores, de amigos, de familiares e as respectivas e impressionantes explicações dos autores. Assim, com este número menos redondo, o destaque tem de ser mais limitado, ao estilo de uma breve. Mas era imprescindível assinalar a data. "A pausa dos quatro dias: toda a verdade sobre uma interrupção voluntária da insensatez".

sexta-feira, janeiro 16

CARTAS. Sou pouco assíduo na caixa de correio do blog, como alguns leitores já constataram. Pois bem, hoje decidi mudar. Sempre que voar para aqui, prometo, farei escala no hotmail. Se vos interessa, foi esta senhora que me convenceu.
Caros estrangeirados,
É sempre reconfortante ouvir uma voz dissonante por entre o coro de fanáticos anti-tabagistas que pretende instaurar a ditadura do pulmão saudável. A verdade é que fumar é um prazer indiscutível (para quem gosta) e que uma das permissas da liberdade individual é poder dar cabo da nossa saúde à vontade, sem ninguém ter nada a ver com isso.
Engraçado que o maior coro da desgraça provenha dos Estados Unidos, onde se gastam somas astronómicas a tentar resolver os problemas de saúde provocados pela obesidade. Naquela sociedade, antes estoirar com os níveis de colesterol do que fumar um cigarrinho! A verdade, meus amigos, é que os não fumadores também morrem! (desculpem lá dar a novidade assim a frio).
Devo confessar que concordo plenamente com as vantagens apontadas no post: a conversa do "vamos lá fora fumar um cigarrinho?" trouxe-me a minha cara metade....
O problema do anti-tabagismo, põe-se com mais permência quando se vive (como vocês, caros estrangeirados) no mundo civilizado. Não é realidade que eu, enquanto portuga emigrada na ex-união soviética, tenha de enfrentar no meu dia a dia (basta o que basta). Aqui, nesta parte do mundo esquecida por Deus e pessimamente governada pelos homens, fumar é um símbolo de prestígio. Quer dizer que não precisas do dinheiro que gastas em cigarros para comer.
Cumprimentos e continuem com a boa blogada!

Isabel no Reino de Rus
Ps, principalmente para Londres- não se queixe do clima aí. Há sítios em que se está pior, acredite!
HÁBITOS Um jornalista luso vai a uma conferência de imprensa no ministério do Interior francês. Chega dois minutos depois da hora estipulada. Entra com mais três camaradas. Lá dentro estavam 200 e tal jornalistas, ouvindo, sentados, o respectivo ministro.

quinta-feira, janeiro 15

EL PITILLO. Companheiro de luta pró-tabágica confessava-me há pouco tempo como lhe era cada vez mais difícil argumentar em prol desta nobre causa. Pior, a medo o cobarde chegou mesmo a admitir que começava a «perceber» as razões dos fanáticos. «Porque não é só vício que é um problema», vomitou a besta, «isto lixa-nos a vida em todo o lado». Pois bem meu caro, se tu não vês, eu elucido-te sobre algumas das vantagens do belo pitillo, bem mais importantes que o vício:
No local de trabalho (onde é permitido):
Os anti-tabagistas nunca se sentam ao teu lado. Em média, duas baforadas chegam para os afastar e irritar. Com nenhum insulto consegues este efeito.
No local de trabalho (onde é proibido):
«Queres vir fumar um cigarro lá fora?» E está feito. Dois ou três intervalos diários com a mesma pessoa podem ser mais úteis que uma lua cheia à frente do mar.
No restaurante:
Os carrinhos de bébés afastam-se para a outra ponta da sala. Vão berrar para o raio que os parta, portanto.
Em casa de gente que não fuma:
Para seres bem educado basta não fazeres nada. Ou seja, passas pelo pequeno sacrifício de não fumar durante umas horas e ficas logo com fama de gentleman.
Nas relações furtivas:
As mulheres não querem ter filhos de fumadores. Sonham que os rebentos vão ser desportistas e esse género de coisas.
Nas relações semi-sérias:
Quebra a escalada sentimental do pós-sexo. À primeira pergunta inconveniente atiras com o clássico «passas-me o meu maço». E está posto o gelo.
Nas relações sérias:
É o único pretexto para sair de casa depois da meia-noite. «É claro que a história da tua mãe me interessa, mas continuamos assim que eu voltar, pode ser?» Depois, claro, «o único sítio aberto era a estação de serviço da auto-estrada, o que é que queres que eu faça?».
Na vida:
O Macário Correia é anti-tabagista. Há mais e melhores exemplos, eu sei, mas como imaginas não vou aqui enxovalhar ninguém.
OUTRO MUNDO É IMPOSSÍVEL. Amanhã começa o Fórum Social Mundial. Desta vez a discussão da globalização vai ser em Mumbai, na Índia. Alguém sabia? Alguém leu uma linha sobre o assunto? Alguém tem vontade de acompanhar o que se vai passar? Alguém tem esperança que uma reunião completamente incógnita possa influenciar o rumo do mundo? Ninguém. Agora, ninguém. Há dois ou três anos, um mar de gente. Se bem se recordam, o Fórum de Davos chegou a modificar toda a a agenda de trabalhos para não ser visto como o oposto de Porto Alegre. A Organização Muncial do Comércio suava as estopinhas para provar ao mundo que a sua função era humanitária e até o G8 inventava cimeiras para questões sociais. Hoje isso seria tudo uma anedota. Voltaria a ser uma anedota. O que é que aconteceu, entretanto, para que a globalização deixasse de ser um tema mediático? Eu digo-vos: os partidos, as ideologias... essas merdas que vocês gostam. Entretanto, claro, tudo na mesma. É triste.

quarta-feira, janeiro 14

MISSAS E JORNAIS. Em apenas um ano, mais de cem mil pessoas deixaram de ir à missa em Inglaterra. De acordo com dados oficiais da Igreja inglesa, revelados ontem, os números representam uma queda superior a oito por cento. Pensassem os padres anglicanos como alguns jornalistas portugueses e o diagnóstico estava feito: os cidadãos têm poucos hábitos religiosos. Só pode ser isso.

terça-feira, janeiro 13

LULA O presidente Lula propôs ontem em Monterrey ao presidente dos EUA a suspensão da recolha das fotografias e impressões digitais aos brasileiros e norte-americanos que entram no outro país. Se for aceite, conseguiu o que queria para o Brasil. Mas os restantes países perdem um aliado de peso.
EXEMPLO O carro de serviço do ministro dos Transportes francês, Gilles de Robien, vai ter instalada uma caixa negra que vai registar a velocidade a que anda. Além de inédita, a novidade mostra que o ministro é espirituoso, pois foi precisamente o carro dele que foi "apanhado" por uma revista de automóveis em transgressão quando ia inaugurar um radar de controle de velocidade. Querem mais transparência?
AO LONGE. O emigrante, como podem supôr as almas mais sensíveis, sofre muito com a falta dos valores espirituais da terra. Por isso, prefere convencer-se que nada sobreviverá à sua ausência. Até que um dia, um amigo qualquer - chamemos-lhe gajo – resolve acabar com esta doce ignorância e telefona para lhe dizer coisas como: «viste aquele Maciel? O tipo é bom pá! Temos jogador» Isto, meus amigos, parecendo que não, custa muito. Como custa aquele telefonema a meio da noite de três gajos bêbedos (ou drogados, não consigo distinguir pela linha) com este discurso perverso: «isto está muita boooom pá! Só cá fazes tu falta. Se visses como é que está a...» Também não se diz. É incómodo. E agora, pior ainda, a moda chegou aos blogues. É o Silva, que nem conheço, a falar da esplanada do Casanova e dos copos no Lux; o capitão Vitor Lazlo a puxar aquela conversa de mecânico de alças que nos alegrava as noites acidentais. Enfim. Eu um dia vingo-me.

segunda-feira, janeiro 12

GUERRAS CIVIS Avançando com um balanço de 2003, o primeiro-ministro francês disse hoje que houve menos 1.510 mortos em acidentes de viação a menos que os 7.242 registados em 2002. E - boa notícia também para o défice do sistema de saúde - menos 43.000 feridos nos últimos dois anos. Ora, com o duo Jean-Pierre Raffarin/Jacques Chirac a salvar tantas vidas em França, porque é que a administração Bush insiste em baixar a população mundial - em particular, a do seu próprio país?
THE SIMS 2 Imagine que está apenas a jogar um jogo de computador. O objectivo é construir a vida de uma personagem. Imagine: é uma oportunidade para concretizar sonhos antigos e ter fantásticas casas com piscina e jacuzzi, fabulosos carros desportivos e empregos interessantes. Imagine que neste jogo pode até cultivar pés de cannabis. Imagine que, no final de uma longa jornada de trabalho virtual, desejoso de vestir algo mais confortável, encontra a sua mulher...

Enfim, pode ser que, sendo um jogo, seja possível dar a volta. Imagine.

FLASHBACK (Sobre o que Paul O'Neill, ex-secretário do Tesouro dos EUA disse sobre a invasão do Iraque não faltam comentários, que podem encontrar nos outros blogues. Não tenham problemas em mudar de canal.) Faz pouco mais de um ano que O'Neill foi literalmente despedido, sem direito a pré-aviso nem direito de resposta. O então porta-voz da Casa Branca, Ari Fleischer, ficou com a batata quente: explicar aos jornalistas, que encontraram uma forma genial de introduzir a questão.
BRASIL Fico orgulhoso por ver que o Brasil, essa nação que dá coerência ao estranho conceito da lusofonia, está a fazer frente aos Estados Unidos. Ao abrigo do princípio da reciprocidade, começou a escanar as impressões digitais e a fotografar os norte-americanos que entram no país, tal como fazem aos brasileiros nos EUA. E tem-se aguentado contra as pressões e protestos. Embora a fórmula an eye for an eye, a tooth for a tooth seja reprovável em numerosas situações, esta iniciativa de Brasília pode muito bem servir para sensibilizar os cidadãos norte-americanos, que devem estar a leste do que a sua administração faz e do que isso implica para pessoas cujo único crime foi o de quererem entrar noutro país.

Os portugueses e outros 27 países deviam estar isentos, mas na prática parece que isso não acontece.

VÉU O que se passa nas redacções dos jornais é quase opaco. Já o que vai na cabeça dos jornalistas é, muitas vezes, perceptível. O provedor dos leitores do Le Monde, Robert Solé, deu conta na sua crónica deste sábado que os jornalistas do jornal francês estão divididos sobre o uso do véu islâmico nas escolas e deu conta de uma reunião da redacção, na semana passada, para discutir o assunto. Solé não só dessacralizou o funcionamento do jornal, como ajudou a humanizar os profissionais que o redigem. Levantou ele próprio um véu. E mesmo assim, dois dias depois, o céu continua lá em cima, ora com nuvens chuvosas, ora com abertas radiosas. Enfim, há jornais de referência e jornais de referência. A ver vamos se Solé resiste a mais esta.
BOM DIA Uma das primeiras regras que aprendi quando cheguei em Paris foi cumprimentar os lojistas. Sempre que entro na padaria, no café, na venda dos jornais ou numa grande loja de roupa, a primeira coisa que faço é responder ao bonjour que oiço de trás do balcão ou de um empregado que passa. À saída, trocamos um bonne journée e um au revoir, sem sabermos se nos vamos rever. Este hábito entranhou-se, e em Portugal dou por mim a dizer boa tarde a uma caixa de supermercado que está demasiado preocupada em compor melodias com a passagem dos códigos de barras e não chega a levantar os olhos da registadora. Ou a fazer todo o caminho da mesa à porta de um restaurante em marcha-a-ré, à espera de um adeus, até à próxima, obrigadinho. E nada - ou quase nada. Sem querer generalizar, a coisa passa-se melhor aqui. Podemos discutir os tons de cumprimentos: artificiais, irritantes ou genuinamente alegres e simpáticos. Podemos questionar se isto é determinante para voltar ali ou se é a eficácia do serviço que importa. Podem até fazer pouco deste estrangeirado por escrever sobre coisas tão fúteis. Mas devo confessar que a vida é feito de banalidades, mesmo aqui, no mundo civilizado.

Ainda ando a pensar no filme. Lembrei-me que, com o entusiasmo, não referi John Ford e tantas outras figuras do western, mas não foi desprezo. Um post de cada vez.

INVEJA. Em Nova Iorque neva (-2c diz o NYT). No Rio «O sol fez as pazes com os cariocas», diz o Globo (30/34c). E eu aqui, nas meias tintas.

domingo, janeiro 11

DEVER DE RESPOSTA. Caro João:
Escrever bem não é um mérito qualquer. Contas por alto, o dom deve bafejar uns 5% dos nossos cronistas. Se JPC vem engrossar esta margem eu, como leitor, dou-lhe automaticamente as boas vindas. É esta a primeira razão dos meus elogios. Já basta que ninguém se indigne com os textos dos nossos ilustres deputados que começam com frases como «O ano de 2003 foi mau». Ou com o espaço nobre que algumas senhoras ocupam nos nossos jornais para dizerem ao mundo que «É importante ser feliz».
Mas tu falas do conteúdo, obviamente. É claro que não há verbo que compense «dislates» e «incorrecções factuais». Mas quanto a isso não te posso responder, infelizmente, porque o Expresso não chega ao mundo civilizado. O que te posso dizer, pelas citações que vejo, é que tanto o texto como as tuas críticas tresandam à alergia ideológica do costume. E nenhum é sensaborão.

sábado, janeiro 10

MAN WITHOUT A STAR Acho enervante quando batem palmas a meio de um set de jazz e nunca desperdicei lágrimas num filme do Lars von Trier. Mas hoje, depois de ver esta obra, tive de enxugar os olhos e retesar-me na cadeira para não me levantar, aplaudir e pedir bis. Nas mãos de King Vidor, Kirk Douglas fez o melhor filme de cowboys de que tenho memória - a par de Johnny Guitar, mas noutro estilo. O cinema foi inventado para que estes filmes existam. Temos um herói, justo, corajoso, corajoso, prudente, divertido, mulherengo, terno, heróico. Temos paisagem e contexto histórico. Temos romance. Temos humor. Temos até música. Temos, acima de tudo, um bom argumento com excelentes diálogos e magnificamente dirigido. Um acrobata no arame tem menos equilibrio. Johnny Guitar é o western em poesia. Randolph Scott e Budd Boetticher fizeram alguns dos clássicos que mantiveram o género. Man without a star é daqueles filmes em que os adjectivos se repetem e os pleonasmos não chegam.
A RETÓRICA DA VIDINHA. Quando escrevi o post anterior ainda não tinha lido este texto. É pena, porque está lá tudo o que queria exemplificar. Diz JPH que as «declarações públicas definitivas e irremediáveis sobre os mais diversos assuntos» acabaram por trair JPC, que tanto mal disse do Expresso e agora acabou a escrever para lá. Por estas e por outras, continua, é «que me recuso – por exemplo – a dizer que sou radicalmente contra a posse pelo Estado (ou aparentados, como a PT) de meios de comunicação social. Não posso. Sabe-se lá se um dia não lhes estarei a bater à porta a pedir emprego». Não há retórica que esbata contra esta vidinha, de facto.
JPC.
Premissa 1: Dentro e fora da sua geração, o João Pereira Coutinho é uma das pessoas que melhor escreve na imprensa portuguesa.
Premissa 2: O Expresso, quer a blogosfera queira quer não, é o Expresso: com todos os seus defeitos e virtudes, o jornal de referência que mais leitores tem por edição.
Conclusão: A estreia de João Pereira Coutinho no Expresso é um acontecimento feliz.

Há quem ponha em causa este silogismo por achar que o homem é convencido até à última casa, pretensioso e arrogante. Pela amostra daquilo que escreve até acredito que sim. Mas ao contrário de quem faz este tipo de crítica sou bastante menos exigente com as páginas de opinião que leio. Basta-me que sejam bem escritas, tenham humor e algumas ideias. Estou-me completamente borrifando para o perfil do homem por trás da assinatura. Só quero lê-lo para poder concordar ou discordar. Não quero tomar chá nem construir uma bela amizade.
Depois, há também quem acuse o estilo maniqueísta de JPC. A bílis em excesso. Com isto concordo em certa medida. Espero que o lado institucional do Expresso sirva para acrescentar pragmatismo a alguns excessos. De qualquer modo, enquanto a opção for entre o determinismo destrutivo e o equilíbrio sensaborão não hesitarei um segundo. Finalmente, há quem insinue que JPC só trocou o Independente pelo Expresso por uma questão de dinheiro. Aqui só não percebo porque é que se insinua. É óbvio.
Acho que não vale a pena citar os restantes esgares de ódio. Tudo redunda no mesmo: não gostam que o tipo seja bom e não gostam que o tipo seja de direita. Eu cá não sou invejoso.

sexta-feira, janeiro 9

EXCITAÇÃO GRÁFICA. Pois é. Aprendi a pôr imagens. A responsável pelo feito é esta simpática senhora. Para ela um muito obrigado. Para todos, votos de um 2004 feliz. Fiquem com a imagem do ano.
HOMENAGEM AO DIA DE REIS.

quinta-feira, janeiro 8

BILL MURRAY Ontem fui ver Lost in translation, da Sofia Coppola, filha do Francis Ford - e prima do Nicolas Cage - e gostei. Mais do que do anterior Virgens Suicidas, demasiado deprimente. Sou um admirador discreto do Bill Murray e não me chocou vê-lo neste papel mais dramático, embora se reconheça com agrado um pouco da sua veia cómica e irónica em algumas cenas em que os próprios figurantes se escangalham a rir. O filme roda à volta da tensão romântica que é criada com a Scarlett "barriguinha sexy" Johansson, criando um par de americanos perdidos na imensa Tóquio e ao mesmo tempo desorientados nas suas próprias vidas. Embora os japoneses saiam um pouco tocados pelo retrato escarninho que é feito no filme, a sua excentricidade nunca conseguirá bater a dos EUA. Conclusão: óptimo filme, boa banda sonora, excelentes interpretações. Já li que Murray é um proto-candidato aos óscares, mas duvido que a influência do clã Coppola seja suficiente. Ele desdenhou: "It's a really unattractive sight to see an actor or actress who really wants an Oscar. And you often see it on the show, you see their faces and the desperation is so ugly. Desperation is not a quality I long for. I'm over the Oscar. Sometimes people win it and you think, 'This can't be true.' It's a little bit of a popularity contest, too." Pode ser dor de cotovelo para um actor que, aos 53 anos, nunca foi nomeado (não é o único) e que acaba a dizer que só se interessa em fazer filmes que as pessoas gostam de ver. Yeah, right... Pormenor: a realizadora, que é também autora do argumento, disse que escreveu a personagem para Murray e que se ele não tivesse aceite desistia do filme.
DOIS AO QUADRADO (MENTAL). Estou abismado com o novo canal da sociedade civil. Nunca mais tinha ouvido falar da coqueluche do ministro Morais Sarmento até que há uns dias, no avião, passei os olhos por um jornal que, aparentemente, também faz parte da dita sociedade civil abnegada que vai «ajudar» o canal a retomar os bons caminhos do serviço público. Depois de perder alguns minutos a reflectir sobre estes exemplos bonitos de solidariedade civil fiquei a saber que o dois, perdão o 2:, é um projecto revolucionário, peregrino e iluminado (isto para resumir 44 adjectivos). Por exemplo, vai começar as emissões à tarde com a transmissão simultânea da Euronews, o que é absolutamente extraordinário. Deduzimos, pois, que o Euronews faz parte da nossa sociedade civil, o que deve ser bom (Europa/news/Portugal... tudo de bom). Depois terá um programa sobre política chamado Parlamento, um de ciência chamado 2010, um de religião chamado 70x7, o Novos Horizontes, o Bombordo etc, etc. Na mesma linha, tenho uma ideia a propor para um programa cultural: Artes e Letras. Não é genial? E que tal fazer uma rubrica de cinema temática e chamar-lhe, mmm.... digamos... Cinco Noites, Cinco Filmes! É giro não é? Já sabem, para o próximo grupo de reflexão contem comigo. É fácil isto. Basta excluir o Acontece, não é?
OS VERDES. Sobre a mais recente palhaçada casapiana, destaco a intervenção da deputada Isabel Castro sobre o assunto, em pleno hemiciclo (!), que de uma penada fez luz sobre todo o assunto. «Eu penso que há um problema grave ãhhhh.... e que esse problema grave ãhhhh.... exige que a justiça funcione». Aí está. O poder de síntese. O estilo acutilante. Crítica, mordaz, não obstante educada e subliminar. Brilhante. Eu voto verde.

quarta-feira, janeiro 7

CABALA EM MARTE. Não sei se repararam, mas as primeiras imagens da Nasa Spirit tinham um ligeiro tom rosa. Agora, passaram a alaranjadas. É inadmissível! Quantas mais provas serão necessárias para demitir o sr.Progurador-Geral? Pergunto, quantas??
AIR LUXOR. Ver uma empresa nacional a trepar a concorrência, copiar bons exemplos estrangeiros e assumir uma postura ambiciosa sabe bem. Era por isso que eu gostava da Air Luxor. Chegou, viu e venceu num mercado que mais parecia de camionagem aérea do que de transporte de pessoas. De tal forma respeitava este invulgar exemplo pródigo que quando vi as televisões noticiarem o «Caos na Air Luxor», há alguns dias, resolvi dar aos senhores o benefício da dúvida (até porque o bilhete estava comprado). E o que vos posso dizer agora, meus caros concidadãos bloggers, depois da experiência traumática de que ainda recupero, é que já fui mais bem tratado com o meu cachecol azul e branco nos estádios da segunda circular. Palavra de honra, há dias em apetece ser terrorista....

terça-feira, janeiro 6

OLÁ! Voltei. E assim que puder vou fazer de emigrante presunçoso para contar o que vi na nossa terra. Até já.
CASA PIA Pela rádio, jornais e internet ouço e leio reacções ao discurso do Presidente da República sobre o processo, todas positivas. Mas muitos destes comentadores e políticos não se escusaram a criticar a anexação de cartas anónimas quando, no fundo, a questão não era essa. Não sou formado nem suficientemente informado em Direito para questionar a opção do magistrado. Mas parece-me que tudo isto foi originado num crime de violação do segredo de justiça. Fontes e meios transmissores devem ser devidamente sancionados. E os outros que reproduzem tais informações igualmente repreendidos. A prática que desde o início se verificou e que tantos repugnaram a certa altura continua sem que tenha sido tomada uma atitude legítima pelas autoridades competentes. Se foram os jornalistas a desencadear este caso, não devem ser os mesmos a arruiná-lo. E se os advogados, magistrados e investigadores querem que se faça Justiça, usem meios legais e leais. O resto deve ser resolvido nos tribunais. Ou devia.

segunda-feira, janeiro 5

EXPRESSO Já tinha constatado uma perda de interesse e um número cada vez maior de queixas e lamentos, apesar de o semanário manter o estatuto de referência. Mas quando podemos colar algumas peças, ficamos imensamente desiludidos. Na edição deste sábado, logo na primeira página, uma "notícia" dá conta da substituição iminente de Jorge Braga de Macedo por Basílio Horta no Centro de Desenvolvimento da OCDE, quando isso não é exacto. O actual embaixador português junto da OCDE dirige aquela instituição desde Outubro, mas em funções diferentes das que exercia o ex-ministro das Finanças. Só hoje percebi que Braga de Macedo vai ser colunista no caderno de economia.
VOAR Dizia um quadro de um banco espanhol há uns anos num almoço que quanto mais voava (fazia várias viagens por semana), mais receio tinha. Perguntei-me porque se daria Deus ao trabalho de dar nozes a certas pessoas. Mas nunca esqueci esta experiência. Não é que a vintena de vôos que faço por ano chegue para me amedrontar. Todavia, a confusão com a Air Luxor que pairou sobre o meu regresso - vim num avião fretado sem ser informado sobre a companhia, espanhola - e o drama que encontrei em França, com a morte de centena e meia de pessoas que apenas desejaram um Natal com mais calor, contribuem para os receios. Se compararmos as estatísticas, morrem de certeza mais pessoas em acidentes de viação por ano. Mas as chances de sobreviver não se comparam.
REGRESSO Pela camada de nuvens que avistei ontem do avião prevejo longas semanas sem ver o sol que iluminou Lisboa durante as últimas duas semanas. Demorámos uns bons 15 minutos a atravessar a espessa almofada de água que paira sobre os gauleses. Astérix e companhia tinham razão em temer apenas que o céu lhes caísse em cima.