sexta-feira, janeiro 30

ORWEU. O diálogo que se segue é um exerto de uma conversa entre dois jornalistas, na redacção do jornal Farol dos Piolhos, no dia 30 de Janeiro de 2006. Num tom de exemplar civilidade, os dois profissionais discutiam a legitimidade do programa americano para a «Democratização da orla costeira africana», onde se sabia estarem refugiados os principais cabecilhas da Al Aqsa, junto de plataformas petrolíferas. Era então o maior risco que o mundo civilizado enfrentava, já que os perigosos guerrilheiros eram suspeitos de estar armados com as temíveis ogivas nucleares que podiam destruir o mundo inteiro em sete segundos e meio, fabricadas pelos melhores artífices de charutos do regime de Castro:

- É engraçado falares desses cientistas que foram fuzilados por fogo amigo, lembra-me aquele caso Hutton.
- Hutton?
- Sim, aquele em que demitiram os gajos todos da BBC depois deles terem dito que o governo tinha mentido sobre as armas químicas.
- Ahhh, esse! Mas o governo mentiu mesmo não foi?
- Mentiu, mas... (longa pausa)... agora que dizes isso, não me lembro porque é que os gajos foram acusados.
- Morreu um gajo qualquer não foi?
- Foi, o tal cientista, mas acho que esse não tinha nada a ver com a história. Á! Já sei! Eles disseram que o governo tinha «apimentado» um dossier sobre armas químicas, quando na verdade só lhe fez quinze alterações para o «tornar mais forte».
- Mmmmm....

quinta-feira, janeiro 29

HUTTON 1. Enquanto ando às voltas com o trigo factual, refugio-me aqui para o joio opinativo. Greg Dyke, o director-geral da BBC que se demitiu na sequência do relatório Hutton, é o chefe que todos os jornalistas gostariam de ter. Ou deveriam gostar de ter. Voltarei ao assunto, prometo.
LOBOTOMIA Apercebi-me mesmo agora que, além das deformações na fala, a prática diária da lingua francesa afectou-me o raciocínio. Até quando leio inglês tenho um irritante sotaque gaulês que me atrasa a compreensão das palavras. Ridículo.

quarta-feira, janeiro 28

GALPALIZAÇÃO Ontem, no palácio do Eliseu, o presidente Jacques Chirac foi anfitrião de uma cerimónia de apoio ao Pacto Global, iniciativa do secretário-geral da ONU, Kofi Annan, no sentido de comprometer as empresas a respeitar diversos princípios éticos, sociais e ambientais na sua actividade. Dezenas de responsáveis estiveram simbolicamente presentes, entre os quais portugueses, e afirmaram o seu empenho na causa. Provavelmente, no mesmo momento, o porta-voz da Galp fazia declarações ao DN, pouco surpreendido por o ministério do Ambiente, em nome das reservas nacionais de gasolina, ter autorizado a reactivação do parque de combustíveis de Sacavém. Sim, no mesmo local para onde estava anunciado, nos velhos tempos da construção da Expo'98, "o maior parque urbano da Europa". Eis que a esperança surge no fundo o barril. Dispondo-se a zarpar para Sines, a Galp propõe a alteração ao PDM municipal para, quem sabe, se construir uma interessante urbanização, de preferência de habitação social, construída com materiais que não degradem o ambiente e respeitando a reserva ecológica do Estuário do Tejo, que por acaso é mesmo em frente. Assim, e sem infringir os exemplares preceitos louvados a 1.800 km de Lisboa, a Galp poderia vender o terreno por uns milhões de euros que ajudassem a financiar a construção de um novo parque, de acordo com outra importante norma, a de "não prejudicar os interesses da empresa". Parece aquela história do bater de asas da borboleta e do terramoto no outro lado do mundo. Ou da outra, da corrente de ar nos EUA e da constipação no Japão. Neste caso, acho que a borboleta apanhou um resfriado.

terça-feira, janeiro 27

AUSÊNCIA. Uns dias longe do ecrã e um grupo de descrentes pergunta-me logo se já desisti do blogue. Muito pelo contrário! O que aconteceu é que nas últimas semanas reparei que alguns dos nossos melhores blogs têm passado por longos períodos de silêncio. Vai disto, como não gosto de ficar atrás das elites, decidi fazer o mesmo. Portanto, se passo por este sacrifício de quando em vez, é precisamente para vos mostrar, caros leitores, que levo isto muito a sério. Muito obrigado pela preocupação.

segunda-feira, janeiro 26

VIVA A BURKA

Vauro no Il Manifesto
WEBCAM Foi a loucura. Ano e meio depois de ter voltado a Lisboa, um camarada da resistência parisiense comprou uma câmara e lançou a inveja. Fomos nessa, claro. A primeira videoconferência resultou na perfeição e repetimos, a solo e em grupo. Mesmo depois de passada a novidade, continuávamos a gostar de falar uns minutos por dia, à noite, só para matar saudades, para trocar umas receitas ou para dar as últimas do futebol ou da política. A coisa correu sempre tão bem que decidimos marcar um jantar. Um casal de cada lado, de câmara ligada, mantivémos o costume antigo e enquanto uns trataram do prato principal os outros ocuparam-se das bebidas. Quando ligámos o programa, a carne ainda estava no formo, por isso fomos beberricando umas cervejas e fazendo as graçolas de sempre. Quando fomos para a mesa, já estávamos tocaditos. A troca de galhardetes continuou. A fechar o jantar veio o café e a mousse de chocolate da praxe, que fomos digerir para o sofá, onde os temas de conversa são mais sérios e íntimos. A música estava boa, a cerveja e a aguardente continuaram a animar até que decidimos perder o último Metro e aproveitar estes momentos, que a distância tornou mais raros. A cavaqueira continuou até tarde e foi com o amanhecer que decidimos dormir mesmo ali no chão, em camas improvisadas, como nos velhos tempos.
GRIPE AVIÁRIA
Estou muito melhor
do defluxo, obrigado.
O corrimento nasal
foi
estancado.
FEHÉR Felizmente, só posso imaginar a histeria mediática em Portugal à volta da morte do jogador do SLB.
NEVE Caiu durante vários minutos, mas não ficou nada. Maldita chuva que fez derreter tudo. Nem os mosquitos vão poder fazer batalhas de neve. Sinto-me enganado.

sábado, janeiro 24

E MAIS FUTEBOL. Há uns meses, numa breve conversa com um inglês sobre o Euro2004, perguntei-lhe como tinham corrido as coisas por aqui, em 1996. «Bem. Tirando as pessoas que viviam perto dos estádios ou que estavam directamente envolvidas na organização, quem não quis saber do assunto não soube mesmo». Em Portugal, como todos suspeitamos, isto vai ser difícil. Durante um mês, à parte do Euro, vai haver... Euro. Mas o preocupante nem é isto. Para tudo correr bem seria necessário abandonar o vício nacional do desenrascanço, que agora, por razões que me ultrapassam, está na moda elogiar. Já se viu que no que diz respeito à segurança há cursos, seminários, formação e simulações quanto baste para nos convencer que alguém se preocupa com o assunto. Se será suficiente só saberemos na altura.
Mas para que a segurança não esteja para o Euro como o défice para a economia - uma obsessão - é preciso fazer outras perguntas: as câmaras já reforçaram o pessoal para lidar com as toneladas de lixo que vai aparecer em todo o lado?; os comerciantes já providenciaram as encomendas para aproveitar o afluxo de tanta gente?; os trasportes públicos já equacionaram respostas para o acréscimo de movimento?; as mil e uma instituições de turismo já prepararam programas específicos para dar que fazer aos turistas nas semanas de intervalo entre os jogos?; os jornais e as televisões já têm equipas em número suficiente para acompanhar todas as equipas? Pois... na dúvida eu assisto de longe.
GLOBETROTTER. Cumprindo essa árdua tarefa que é promover o Euro 2004, o ministro da Presidência foi a Madrid e agora vai a Londres, Haia, Berlim, Praga, Moscovo, Riga, Estocolmo, Zagreb, Sófia, Atenas e Milão. O Euro é porreiro ou não é?
TRADIÇÕES. O famoso double-decker londrino está em vias de extinção. Cinquenta anos depois de terem sido inventados (creio que pela Leyland), a câmara de Londres está a proceder à substituição impiedosa deste ícone genial dos ingleses. Hoje afastou-os de mais duas linhas centrais. É claro que o fim não é assumido frontalmente - até porque poderia provocar uma revolução nacional -, mas já ficou claro que todos os novos autocarros terão a fronha arrogante dos primos escandinavos. E agora o quê? Querem matar o carteiro Pat?

quinta-feira, janeiro 22

WHEN HARRY MET SALLY. A estreia da versão West End é já em Fevereiro, no Thatre Royal. Imagino que não vai ser fácil fechar os olhos e imaginar a Meg Ryan antes da plástica, o Billy Crystal antes dos filmes de terceira e Nova Iorque antes dos anos 90. Mas dou-me por satisfeito se repetirem esta passagem do evangelho das relações.

Sally: We are just going to be friends, OK?
Harry: Great, friends. It's the best thing...You realize, of course, that we can never be friends.
Sally: Why not?
Harry: What I'm saying is - and this is not a come-on in any way, shape, or form - is that men and women can't be friends, because the sex part always gets in the way.
Sally: That's not true. I have a number of men friends and there is no sex involved.
Harry: No, you don't.
Sally: Yes, I do.
Harry: No, you don't.
Sally: Yes, I do.
Harry: You only think you do.
Sally: You're saying I'm having sex with these men without my knowledge?
Harry: No, what I'm saying is they all want to have sex with you.
Sally: They do not.
Harry: Do too.
Sally: They do not.
Harry: Do too.
Sally: How do you know?
Harry: Because no man can be friends with a woman that he finds attractive. He always wants to have sex with her.
Sally: So you're saying that a man can be friends with a woman he finds unattractive.
Harry: No, you pretty much want to nail them, too.
Sally: What if they don't want to have sex with you?
Harry: Doesn't matter, because the sex thing is already out there, so the friendship is ultimately doomed, and that is the end of the story.
ABORTO. Já vou tarde, mas ainda vou. A sondagem do Público sobre o aborto, de dia 19, mostra-nos que a maior parte dos portugueses, entre 63 e 78 por cento (consoante sejam contra ou a favor a descriminalização, respectivamente) apoiam a realização de um novo referendo. Mais importante que isso, diz que 69 por cento dos portugueses responderiam agora que «sim» e apenas 25 por cento que «não». Quando falei do tema pela primeira vez, há cerca de um mês, criticaram-me por partir de um pressuposto errado: o de que a maioria dos portugueses era a favor da despenalização. Pois bem, agora não sou eu que o digo.

PS: É bom que ninguém tenha vindo destacar o facto de o responsável pelo estudo ser o centro de sondagens da Católica. Será, imagino, porque ninguém põe em causa o profissionalismo do dito. Mas agora que penso no assunto... não era bem isso que andavam para aí a dizer há um mês pois não?

terça-feira, janeiro 20

COJONES. Ontem, na BBC, Tony Blair dispôs-se a ser entrevistado sobre o tema mais quente da política interna inglesa: o aumento das propinas. Não foi uma entrevista qualquer. Blair sentou-se num canto do ringue, sozinho com os seus argumentos. Do outro lado, nada mais nada menos que o mais temido peso pesado do jornalismo político britânico, Jeremy Paxman, e uma plateia de 30 pessoas composta por alunos, pais e professores, que em comum apenas tinham o ódio visceral à proposta do governo. Durante cerca de uma hora, Paxman (que é o que Margarida Marante e Manuela Moura Guedes sempre quiseram ser: um jornalista agressivo mas com uma pinta do caraças) acirrou a plateia até ao limite. E Blair, com a habilidade do melhor domador de leões, voltou a dominar a raiva na ponta da vara. Mais do que os argumentos sobre o assunto - que não diferem muito dos nossos e dos que se discutem nos restantes países europeus, calculo - o que me impressionou em tudo isto foi a coragem do primeiro-ministro. Quando é que veremos um dos nossos ilustres chefes de governo fazer o mesmo? Nunca.
RUC Para os interessados e interessadas, a Rádio Universitária de Coimbra está online: http://www.ruc.pt:8000. Música alternativa sem pretensões.
EFEMÉRIDE Hoje faz quatro dias que este blogue não mexia. Provavelmente, devia ter esperado até aos cinco dias e escrevia um post de 200 linhas sobre o assunto, com depoimentos de leitores, de amigos, de familiares e as respectivas e impressionantes explicações dos autores. Assim, com este número menos redondo, o destaque tem de ser mais limitado, ao estilo de uma breve. Mas era imprescindível assinalar a data. "A pausa dos quatro dias: toda a verdade sobre uma interrupção voluntária da insensatez".

sexta-feira, janeiro 16

CARTAS. Sou pouco assíduo na caixa de correio do blog, como alguns leitores já constataram. Pois bem, hoje decidi mudar. Sempre que voar para aqui, prometo, farei escala no hotmail. Se vos interessa, foi esta senhora que me convenceu.
Caros estrangeirados,
É sempre reconfortante ouvir uma voz dissonante por entre o coro de fanáticos anti-tabagistas que pretende instaurar a ditadura do pulmão saudável. A verdade é que fumar é um prazer indiscutível (para quem gosta) e que uma das permissas da liberdade individual é poder dar cabo da nossa saúde à vontade, sem ninguém ter nada a ver com isso.
Engraçado que o maior coro da desgraça provenha dos Estados Unidos, onde se gastam somas astronómicas a tentar resolver os problemas de saúde provocados pela obesidade. Naquela sociedade, antes estoirar com os níveis de colesterol do que fumar um cigarrinho! A verdade, meus amigos, é que os não fumadores também morrem! (desculpem lá dar a novidade assim a frio).
Devo confessar que concordo plenamente com as vantagens apontadas no post: a conversa do "vamos lá fora fumar um cigarrinho?" trouxe-me a minha cara metade....
O problema do anti-tabagismo, põe-se com mais permência quando se vive (como vocês, caros estrangeirados) no mundo civilizado. Não é realidade que eu, enquanto portuga emigrada na ex-união soviética, tenha de enfrentar no meu dia a dia (basta o que basta). Aqui, nesta parte do mundo esquecida por Deus e pessimamente governada pelos homens, fumar é um símbolo de prestígio. Quer dizer que não precisas do dinheiro que gastas em cigarros para comer.
Cumprimentos e continuem com a boa blogada!

Isabel no Reino de Rus
Ps, principalmente para Londres- não se queixe do clima aí. Há sítios em que se está pior, acredite!
HÁBITOS Um jornalista luso vai a uma conferência de imprensa no ministério do Interior francês. Chega dois minutos depois da hora estipulada. Entra com mais três camaradas. Lá dentro estavam 200 e tal jornalistas, ouvindo, sentados, o respectivo ministro.